terça-feira, 10 de novembro de 2009

piano bar.

Costurava, sempre pontos invertidos, espetava sempre as mesmas marcas na pele fazendo doer.
O gato-xadrez tinha um cheiro guardado, os recortes, retalhos desfiados.
Eu não conseguia nunca sair do piano bar, ouvia as teclas e olhava pra trás e chorava e lembrava e tinha aquela coisa no peito.
Um dia eu tinha achado tudo tão bonito,
e lembro-me de ter beijado teu ombro na primeira noite e tive muito medo da entrega quando já tu fazia parte do meu corpo,
de uma maneira fatal, algo que não se descola sem cortar a carne e sangrar de deixar só fraqueza.
Caminhamos de mão, muito na chuva, torramos boiando no sol e ventamos, sempre muito no choro.
Mas era amor, essa palavra pequena que eu nem sempre entendi, nem sempre achei justa e sempre senti por ti.
Eu construí uma casa, com piano, a casa piano bar, que era pra que tu tocasse a marcha nupcial e também qualquer outra coisa, apertasse as teclas despretensiosamente, que fosse, mas com carinho, mas para mim.
Tu não tocou e a casa piano bar não foi morada, tu não fez morada aqui do meu lado, nem perto, nem nada.
Tu, e era sempre só tu, foi sempre só tu, para mim e para ti.
E eu bato no peito, no meu peito, te mando embora, vai!, te mando embora todos os dias, choro querendo rasgar, arrancar o meu peito e teu nome daqui, mas não sai.
Mesmo tua vida sendo já outra, mesmo eu nunca tendo visto o piano, mesmo sem ver, e já há muito sem ver, teu amor, tua música, teu sorriso (nunca riso desvairado) por mim, eu não consigo descosturar o gato xadrez. Queria, estrebuchá-lo, arrancar tudo meu que os pontos dele prenderam.

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