sexta-feira, 22 de outubro de 2010

camélia.

Dia abafado como meus pedidos de dedicação; as tonturas voltaram e eu como pouco. Lembro quando eu não tinha idéia de como seria à noite, agora sei de tudo e isso me engasga. Eu nasci camélia, já disse, um tanto puta, mas doce. O que se evita dizer com tanto silêncio não será realmente dito? Eu, vidente, abro as cartas sem dó de mim mesma, sabendo que cortes com folhas de carta doem mais que cortes com folhas de livro. Eu sei de tudo, aprendi fora dos livros quando fui dona de um sítio distante das grandes cidades. Lá, eu nunca recebi nenhuma visita, e se recebesse, colocaria a vassoura atrás da porta. Aquela porta pesada de madeira era a grande governanta dos meus dias, encarava-me com rigor quando eu saía para os trabalhos na horta, e, na minha volta, olhava meus pés, para saber se meus sapatos estavam sujos da terra seca da estrada. Eu nunca peguei a estrada, não queria, não era preciso. Agora leio cartas em uma rua central, larguei o sítio e entreguei a grande senhora de madeira aos cupins. Nunca me apeguei a rigores nem a seus servos. O que me irrita é saber que nessa noite será tudo igual e, infelizmente, meu cheiro de camélia não impregnará as ruas dessa metrópole descrente.

5 comentários:

  1. "agora sei de tudo e isso me engasga", "um tanto puta, mas doce", etc... Ficou lindo!

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  2. "...um tanto puta, mas doce.", fantástico. Não sei quais destes lados me encanta mais. De Cecília à Camélia, você é incrível com as palavras.

    beijos.

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  3. Bom, muuuuuuuuuuuuuito bom!
    Esse equilíbrio 'puta doce' deve ser o segredo de todo o universo (risos)

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  4. Tudo o que eu queria era uma porta para mudar a página, encontrar um novo destino!
    Um beijo, moça!

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