sábado, 27 de março de 2010
before the rain.
O telefone toca sempre nas madrugadas, chamados ininteligíveis, rumores de possíveis dias melhores os quais nunca chegam. Eu atendo, e choro, machucada, e depois eu mesma machucando-me. Não quero viver em desespero. Tenho vontade grande do não-viver. Mas então penso em círculos os quais não se fecham, como em Antes da Chuva ,e tenho ganas de ir a Macedônia. Anseio por recomeço, não por falta de amor e sim por falta de força, ou de crença (o que talvez seja a mesma coisa), para agüentar os rumores que ficam somente em rumores. Fujo do ódio, mas ele bate na porta da frente, cada dia mais insistente. Talvez eu deva sair pelos fundos, ir para onde Time never dies The circle is not round. Talvez uma das minhas únicas crenças.
quarta-feira, 24 de março de 2010
poeminha bobo da espera.
Será que ele vem?
Será que vem mesmo em abril?
Se ele vier vou convidá-lo para ir ao cinema, ao parque, ao 512, a um passeio pelo lago Guaíba.
Se ele vier, vou convidá-lo para minha cama e para mim.
Ele disse que vem e que vai desenhar no meu corpo, a minha tatuagem só dele.
Se ele vier, vou fotografá-lo distorcido e com flash amarelo; ele é claro, combina.
No começo vou falar pouco, assuntos sem nexos: “Como vai tua mãe?”, e depois vou falar muito, ainda sem nexo, e só vamos nos entender na hora do sexo.
Então vai ser preciso não falar nada e se tocar muito, porque eu vou querer sentir tudo dele na minha pele, e será outra tatuagem.
E vou decorar uma música bem bonitinha da banda que ele me mostrou pra cantar antes da gente dormir.
Se ele vier vou achar as folhas de plátano tão lindas que quererei ter uma coleção delas, uma para cada lembrança dele deixada aqui.
Eu espero que ele venha...
Será que vem mesmo em abril?
Se ele vier vou convidá-lo para ir ao cinema, ao parque, ao 512, a um passeio pelo lago Guaíba.
Se ele vier, vou convidá-lo para minha cama e para mim.
Ele disse que vem e que vai desenhar no meu corpo, a minha tatuagem só dele.
Se ele vier, vou fotografá-lo distorcido e com flash amarelo; ele é claro, combina.
No começo vou falar pouco, assuntos sem nexos: “Como vai tua mãe?”, e depois vou falar muito, ainda sem nexo, e só vamos nos entender na hora do sexo.
Então vai ser preciso não falar nada e se tocar muito, porque eu vou querer sentir tudo dele na minha pele, e será outra tatuagem.
E vou decorar uma música bem bonitinha da banda que ele me mostrou pra cantar antes da gente dormir.
Se ele vier vou achar as folhas de plátano tão lindas que quererei ter uma coleção delas, uma para cada lembrança dele deixada aqui.
Eu espero que ele venha...
terça-feira, 23 de março de 2010
das pintas.
eu tenho essas pequenas pintas pelo corpo,
queria-as sementes, das quais brotassem flores-cores:
eu seria, então, jardim.
queria-as sementes, das quais brotassem flores-cores:
eu seria, então, jardim.
quarta-feira, 17 de março de 2010
a morte de rosa.
Rosa morria. Hernandez não se importava, ele tinha pressa para as coisas dele. Talvez não fosse crueldade, todos têm pressa, e ela já não era mais alguém que valesse a pena manter viva. Não, Hernandez achava não ter mais nada a tentar com Rosa. Ele tinha um novo amor, mais leve, mais moderno, talvez menos profundo, mas ele estava gostando disso, das coisas simples. Andar na superfície realmente exige menos esforço. E Rosa morria. Hernandez a apagava a cada negativa em tentar amá-la. Achava que ela não merecia o seu suor, ele não iria desperdiçar a sua juventude com uma pessoa que lhe exigia tanto. Ele era como era, não queria mudar, não queria enraizar-se em Rosa, tinha preguiça de regá-la. Hernandez tinha as coisas dele pra fazer, coisas alegres. Tudo bem, Rosa tinha sido muito as raízes dele nos momentos mais doídos, mas enfim, fora uma escolha dela. Agora ele estava bem, e era isso que precisava viver, o estar bem. Rosa falava muito, chorava muito, amava muito: Rosa cansava. E mesmo que ela fosse linda, mesmo que fosse doce, mesmo que fosse o melhor sexo, e até mesmo poesia... Mesmo assim, não era o que Hernandez queria. Ele decidiu ser Rosa a melhor lembrança, e só. Ninguém o condenaria por isso, afinal, rosas têm espinhos, ele não era obrigado a se arriscar tanto. E Rosa morreu enquanto Hernandez ia ao banco.
da ausência.
como se adaptar a uma ausência?
a uma falta do tudo que completava um quase tudo?
dormir mais, beber mais, ler mais, trabalhar mais, transar mais, fumar mais, viajar mais...
fazer sempre mais de todas as coisas para sentir menos?
talvez...
talvez tornar-se também ausência,
ser a falta de um cheiro, de um toque, de uma voz doce, de um abraço quando se soluça...
estou aprendendo, manipulando a memória, desconstruindo paisagens, deletando sons,
o silêncio, velha estratégia da memória.
buscar sempre algo de novo, preencher com a própria busca e com os encontros.
deixe em paz meu coração
que ele é um pote até aqui de mágoa
e qualquer desatenção, faça não
pode ser a gota d'água...
preencher com a mágoa?
é justo?
a ausência não é justa.
e acho que ela, quando transborda, cobrindo tudo com seu vazio, asfixiando,
dói mais do que a mágoa.
talvez seja escolher o que se suporta melhor,
enquanto o encontrar-o-novo ainda é busca.
afinal, é sempre uma troca.
a uma falta do tudo que completava um quase tudo?
dormir mais, beber mais, ler mais, trabalhar mais, transar mais, fumar mais, viajar mais...
fazer sempre mais de todas as coisas para sentir menos?
talvez...
talvez tornar-se também ausência,
ser a falta de um cheiro, de um toque, de uma voz doce, de um abraço quando se soluça...
estou aprendendo, manipulando a memória, desconstruindo paisagens, deletando sons,
o silêncio, velha estratégia da memória.
buscar sempre algo de novo, preencher com a própria busca e com os encontros.
deixe em paz meu coração
que ele é um pote até aqui de mágoa
e qualquer desatenção, faça não
pode ser a gota d'água...
preencher com a mágoa?
é justo?
a ausência não é justa.
e acho que ela, quando transborda, cobrindo tudo com seu vazio, asfixiando,
dói mais do que a mágoa.
talvez seja escolher o que se suporta melhor,
enquanto o encontrar-o-novo ainda é busca.
afinal, é sempre uma troca.
sábado, 13 de março de 2010
um pássaro listrado.
Ele disse que não estava bem e perguntou:
- Vem me ver?
Cecília replicou:
- Tu quer que eu vá?
- Quero muito.
Cecília foi. Ele usava calça listrada, ela vestido listrado. Ele não estava mesmo bem e ela ficou triste ao perceber. A última coisa dita por ele antes de dormir foi:
- Eu gosto muito de estar perto de ti.
Cecília olhou-o muito tempo dormindo, achou que ele parecia um pássaro machucado. Ela queria pegá-lo no colo, mas apenas fazia cafuné em seus cabelos e segurava sua mão. Era bom segurar forte a mão dele e sentir o sangue de ambos correr no mesmo ritmo (pulsar-junto). Ele parou de tremer. Cecília ficou olhando aquele corpo magro, o nariz fino, o bigode retrô, as pernas compridas. Não sabia se chovia, mas ouvia o som dos carros chiarem como se a velha avenida estivesse molhada. Não importava a chuva, ela gostava daquele som. Ela não entendia bem porque estava ali. Talvez porque gostasse muito dele, como quem gosta do morno do sol no inverno; talvez porque apesar dele dizer que tinha medo de tanta coisa, era ela quem tinha medo de dormir sozinha. Cecília cochilou; quando acordou estavam ambos exatamente na mesma posição, deitados de lado, de mãos dadas, joelhos dobrados, os dela encostando-se aos dele, ou vice-versa: formavam um desenho bonito. As folk songs cessaram e ela não dormiu mais. Olhava-o, simplesmente, e sentia carinho, uma carinho enorme, como quando eles se viram pela primeira vez e, segundo ele, ela chegou de canto e disse "oi”. Ele acordou assustado, Cecília o achou bonito. Transaram, na fala dela, ou treparam, de acordo com a dele.
- Eu adoro trepar contigo.
Cecília sorriu. E parecia realmente tão intenso. Cecília gostava quando ele cantava. Fumaram (sempre). Ele teve tosse, depois voltou a tremer, a sentir tontura e dor de cabeça. Cecília abraçou forte, beijou-lhe o rosto. Disse que achava que ele ia ficar bem. As peles deles começaram a puxar uma pela outra, como se soubessem que o tempo corria. Cecília perguntou:
- E a dor de cabeça, tá muito forte.
- Tá forte, mas não o suficiente.
Seus corpos ficavam bonitos assim, nus e grudados; mais bonitos do que com as listras. Água, precisavam de água. Conversaram sobre coisas nunca antes ditas, as coisas feitas pelas pessoas antes mesmo de se encontrar, como a música que ele compôs para ela muito antes de se verem e subirem lá no alto, para ver o pôr do sol do lago-rio. Riram, ela sentada na beira da cama, riram. Mas ele notou no fundo de Cecília algo de tristeza.
- Não estou triste, só acho estranho.
Dormiram tarde e acordaram cedo. Cecília presenteou-o com um livro:
- Pra ti ler na viagem.
Era uma despedida, ele quem partiria (as cidades cada vez maiores, as quais Cecília tanto temia). Ele disse fazer tempo que não ganhava um presente legal. Aperto, vontade de não ir. Cecília falou, quase sem falar:
- Sabia que tu suspira enquanto dorme?
- Como assim?
- Tu dá uns suspiros enquanto está dormindo, ora.
Na rua, ela viu que sim, havia chovido (eram as águas de março fechando o verão). Cecília viu tanta coisa naquela manhã. Aprendeu que podia amar pássaros, que talvez aquela fosse uma forma bonita de amor. Cecília achou que também parecia um pássaro, mas menorzinho. No final, eles ficariam bem, teriam ninhos bonitos e saberiam voar.
PS1: Não suma!
PS2: Não morra!
- Vem me ver?
Cecília replicou:
- Tu quer que eu vá?
- Quero muito.
Cecília foi. Ele usava calça listrada, ela vestido listrado. Ele não estava mesmo bem e ela ficou triste ao perceber. A última coisa dita por ele antes de dormir foi:
- Eu gosto muito de estar perto de ti.
Cecília olhou-o muito tempo dormindo, achou que ele parecia um pássaro machucado. Ela queria pegá-lo no colo, mas apenas fazia cafuné em seus cabelos e segurava sua mão. Era bom segurar forte a mão dele e sentir o sangue de ambos correr no mesmo ritmo (pulsar-junto). Ele parou de tremer. Cecília ficou olhando aquele corpo magro, o nariz fino, o bigode retrô, as pernas compridas. Não sabia se chovia, mas ouvia o som dos carros chiarem como se a velha avenida estivesse molhada. Não importava a chuva, ela gostava daquele som. Ela não entendia bem porque estava ali. Talvez porque gostasse muito dele, como quem gosta do morno do sol no inverno; talvez porque apesar dele dizer que tinha medo de tanta coisa, era ela quem tinha medo de dormir sozinha. Cecília cochilou; quando acordou estavam ambos exatamente na mesma posição, deitados de lado, de mãos dadas, joelhos dobrados, os dela encostando-se aos dele, ou vice-versa: formavam um desenho bonito. As folk songs cessaram e ela não dormiu mais. Olhava-o, simplesmente, e sentia carinho, uma carinho enorme, como quando eles se viram pela primeira vez e, segundo ele, ela chegou de canto e disse "oi”. Ele acordou assustado, Cecília o achou bonito. Transaram, na fala dela, ou treparam, de acordo com a dele.
- Eu adoro trepar contigo.
Cecília sorriu. E parecia realmente tão intenso. Cecília gostava quando ele cantava. Fumaram (sempre). Ele teve tosse, depois voltou a tremer, a sentir tontura e dor de cabeça. Cecília abraçou forte, beijou-lhe o rosto. Disse que achava que ele ia ficar bem. As peles deles começaram a puxar uma pela outra, como se soubessem que o tempo corria. Cecília perguntou:
- E a dor de cabeça, tá muito forte.
- Tá forte, mas não o suficiente.
Seus corpos ficavam bonitos assim, nus e grudados; mais bonitos do que com as listras. Água, precisavam de água. Conversaram sobre coisas nunca antes ditas, as coisas feitas pelas pessoas antes mesmo de se encontrar, como a música que ele compôs para ela muito antes de se verem e subirem lá no alto, para ver o pôr do sol do lago-rio. Riram, ela sentada na beira da cama, riram. Mas ele notou no fundo de Cecília algo de tristeza.
- Não estou triste, só acho estranho.
Dormiram tarde e acordaram cedo. Cecília presenteou-o com um livro:
- Pra ti ler na viagem.
Era uma despedida, ele quem partiria (as cidades cada vez maiores, as quais Cecília tanto temia). Ele disse fazer tempo que não ganhava um presente legal. Aperto, vontade de não ir. Cecília falou, quase sem falar:
- Sabia que tu suspira enquanto dorme?
- Como assim?
- Tu dá uns suspiros enquanto está dormindo, ora.
Na rua, ela viu que sim, havia chovido (eram as águas de março fechando o verão). Cecília viu tanta coisa naquela manhã. Aprendeu que podia amar pássaros, que talvez aquela fosse uma forma bonita de amor. Cecília achou que também parecia um pássaro, mas menorzinho. No final, eles ficariam bem, teriam ninhos bonitos e saberiam voar.
PS1: Não suma!
PS2: Não morra!
quarta-feira, 10 de março de 2010
lover's day.
Oh but the longing is terrible,
A wanton heart under attack.
I wanna love you
All the way off.
I wanna break your back.
Colour of all that's hysterical,
Travels along your bones.
Just to be near you sucking your skin,
Not gonna leave you alone.
Yes here of course there are miracles,
A lover that loves that's one.
Groomed with the laughter,
Ecstatic disaster,
Come let's arouse the fun!
We could build an engine,
Out of all your rising stars.
Tear apart the apart,
We seem to think we are!
Call off work let's lay!
Call it Lovers Day!
Call it Lovers Day!!
Give me the keys to your hiding place,
I'm not gonna tear it apart.
I'm gonna keep you week in the knees,
Try to unlock your heart.
You're gonna turn me animal.
You're gonna turn me dumb.
Your kiss in the night,
Bringing the light,
You're like the rising sun.
I hunger for you like a cannibal,
Not gonna let you run.
I'm gonna take you,
I'm gonna shake you,
I'm gonna make you cum.
Swear to God it will get so hot,
it'll melt our faces off.
Then we can see,
The you the me,
Beyond mirrors outside clock.
Held naked in the light,
Held gently,
Held tight,
So soft!
Get Off!
Get Off!
Ball so hard,
We'll smash the walls,
Break the bed,
And crash the floors!
Don't Stop!
Laugh and Scream!
And have the neighbors call the cops!
'till all the eyes that've seen our fire play!!
Mark it down.
Call it Lovers Day!!
Yes here of course there are miracles.
Under your sighs and moans.
I'm gonna take you.
I'm gonna take you.
I'm gonna take you home.
(tv on the radio)
A wanton heart under attack.
I wanna love you
All the way off.
I wanna break your back.
Colour of all that's hysterical,
Travels along your bones.
Just to be near you sucking your skin,
Not gonna leave you alone.
Yes here of course there are miracles,
A lover that loves that's one.
Groomed with the laughter,
Ecstatic disaster,
Come let's arouse the fun!
We could build an engine,
Out of all your rising stars.
Tear apart the apart,
We seem to think we are!
Call off work let's lay!
Call it Lovers Day!
Call it Lovers Day!!
Give me the keys to your hiding place,
I'm not gonna tear it apart.
I'm gonna keep you week in the knees,
Try to unlock your heart.
You're gonna turn me animal.
You're gonna turn me dumb.
Your kiss in the night,
Bringing the light,
You're like the rising sun.
I hunger for you like a cannibal,
Not gonna let you run.
I'm gonna take you,
I'm gonna shake you,
I'm gonna make you cum.
Swear to God it will get so hot,
it'll melt our faces off.
Then we can see,
The you the me,
Beyond mirrors outside clock.
Held naked in the light,
Held gently,
Held tight,
So soft!
Get Off!
Get Off!
Ball so hard,
We'll smash the walls,
Break the bed,
And crash the floors!
Don't Stop!
Laugh and Scream!
And have the neighbors call the cops!
'till all the eyes that've seen our fire play!!
Mark it down.
Call it Lovers Day!!
Yes here of course there are miracles.
Under your sighs and moans.
I'm gonna take you.
I'm gonna take you.
I'm gonna take you home.
(tv on the radio)
domingo, 7 de março de 2010
dia 5.
seis meses.
ainda o rancor,
feito uma gangorra que sobe alto e alto e alto...
presos em posições diferentes, sem troca de olhares.
eu quase posso tocar o céu?
mas não alcanço os pés no chão, no meu chão.
solução: virar vento...
um vôo até a casa de uivo.
sei refrescar,
aprendi tocando flauta
e minha doçura cansou de brincar de gangorra.
eu acredito em mim:
no meu nome,
no meu corpo,
no meu cheiro.
eu acredito nos que posso carinhar ao ser brisa.
o rancor já não é inimigo,
nem tampouco é amor:
o rancor é passado.
ninguém mais vai doer em mim,
eu que sou vento fazendo rir as margaridas,
volto também a sorrir no voar.
nas tempestades, agarro-me em um guarda-sol
e deixo os guarda-chuvas molhados/mofados para os que têm pouca fé.
ainda o rancor,
feito uma gangorra que sobe alto e alto e alto...
presos em posições diferentes, sem troca de olhares.
eu quase posso tocar o céu?
mas não alcanço os pés no chão, no meu chão.
solução: virar vento...
um vôo até a casa de uivo.
sei refrescar,
aprendi tocando flauta
e minha doçura cansou de brincar de gangorra.
eu acredito em mim:
no meu nome,
no meu corpo,
no meu cheiro.
eu acredito nos que posso carinhar ao ser brisa.
o rancor já não é inimigo,
nem tampouco é amor:
o rancor é passado.
ninguém mais vai doer em mim,
eu que sou vento fazendo rir as margaridas,
volto também a sorrir no voar.
nas tempestades, agarro-me em um guarda-sol
e deixo os guarda-chuvas molhados/mofados para os que têm pouca fé.
quarta-feira, 3 de março de 2010
silêncios e (des)encontros.
Claro que vivíamos bem. Ou ele pensava em mim como eternamente choro?
Conheci Davi embaixo de uma figueira, ele falava de água, mas tinha cheiro de terra. Davi disse que eu era bonita como a lagoa. Minha secura passou e eu desagüei em seu colo. Juntos fomos morada de Cecília e Antônio. Davi cuidava da nossa horta e estudava teoria literária. Eu tentava literatura e vivia antropologia. Eu carregava Davi, Cecília e Antônio para o trabalho de campo; Davi nos mostrava as bibliotecas e seus segredos. Éramos bonitos os quatro, nossa umidade fazia brotar muitas flores. Numa manhã branca, eu, Antônio e Cecília chegamos ao Parque Itaimbé. O velho parque, onde eu queria mostrar as folhas de plátano e ensinar aos pequenos observar as formigas. A grama fofa, eu e as crianças inventando histórias de mata fechada, sacis e caiporas. O chapéu de Antônio voou e ele correu atrás. Eu e minha filha fomos ajudar na captura; é sempre difícil recuperar os chapéus roubados pelo vento Minuano. O chapéu parou perto de um banco com pintura nova, azul e branco. Enquanto eu recolocava o adereço na cabeça de Antônio, reconheci uma pessoa sentada. Era Hernandez, ele lia o jornal.
- Bom dia, Hernandez.
Ele me viu, nos olhamos na manhã branca enquanto as crianças seguravam meu vestido.
- Quanto tempo, Rosa...
Silêncio. Aquele silêncio que apenas era quebrado duas vezes ao ano pelos telefonemas rápidos de feliz aniversário que dávamos um ao outro. De resto, haviam sido anos de sempre silêncio e nenhum encontro.
- Bonitos teus filhos.
- Brigada, disse Cecília, o Antônio é meu mano, mas eu sou mais velha.
Hernandez sorriu.
Cecília era muito metida, embora tivesse medo de uma infinidade de coisas.
Antônio olhava emburrado enquanto chutava a terra, encardindo a pequena sandália.
Hernandez disse que Antônio parecia comigo. O menino segurou mais forte meu vestido.
- É, ele é desconfiado, mas dado às coisas do lirismo. Já Cecília, gosta de cantar, não é mesmo pequena?
- É, mamãe, eu gosto das músicas que falam do mar.
- Bem, Hernandez, nós vamos indo. Bom te ver.
- Bom te ver, Rosa.
Cecília disse tchau, Antônio abanou e segurou o chapéu.
- Vamos ver quem chega primeiro àquela ponte?
- Vamos!, gritaram os dois, imediatamente pondo-se a correr.
Eu olhei para trás. Hernandez estava pálido como a manhã. Percebi que eu ia chorar, e comecei a correr o mais rápido que pude.
- Quem chegar por último é mulher do padre!
Conheci Davi embaixo de uma figueira, ele falava de água, mas tinha cheiro de terra. Davi disse que eu era bonita como a lagoa. Minha secura passou e eu desagüei em seu colo. Juntos fomos morada de Cecília e Antônio. Davi cuidava da nossa horta e estudava teoria literária. Eu tentava literatura e vivia antropologia. Eu carregava Davi, Cecília e Antônio para o trabalho de campo; Davi nos mostrava as bibliotecas e seus segredos. Éramos bonitos os quatro, nossa umidade fazia brotar muitas flores. Numa manhã branca, eu, Antônio e Cecília chegamos ao Parque Itaimbé. O velho parque, onde eu queria mostrar as folhas de plátano e ensinar aos pequenos observar as formigas. A grama fofa, eu e as crianças inventando histórias de mata fechada, sacis e caiporas. O chapéu de Antônio voou e ele correu atrás. Eu e minha filha fomos ajudar na captura; é sempre difícil recuperar os chapéus roubados pelo vento Minuano. O chapéu parou perto de um banco com pintura nova, azul e branco. Enquanto eu recolocava o adereço na cabeça de Antônio, reconheci uma pessoa sentada. Era Hernandez, ele lia o jornal.
- Bom dia, Hernandez.
Ele me viu, nos olhamos na manhã branca enquanto as crianças seguravam meu vestido.
- Quanto tempo, Rosa...
Silêncio. Aquele silêncio que apenas era quebrado duas vezes ao ano pelos telefonemas rápidos de feliz aniversário que dávamos um ao outro. De resto, haviam sido anos de sempre silêncio e nenhum encontro.
- Bonitos teus filhos.
- Brigada, disse Cecília, o Antônio é meu mano, mas eu sou mais velha.
Hernandez sorriu.
Cecília era muito metida, embora tivesse medo de uma infinidade de coisas.
Antônio olhava emburrado enquanto chutava a terra, encardindo a pequena sandália.
Hernandez disse que Antônio parecia comigo. O menino segurou mais forte meu vestido.
- É, ele é desconfiado, mas dado às coisas do lirismo. Já Cecília, gosta de cantar, não é mesmo pequena?
- É, mamãe, eu gosto das músicas que falam do mar.
- Bem, Hernandez, nós vamos indo. Bom te ver.
- Bom te ver, Rosa.
Cecília disse tchau, Antônio abanou e segurou o chapéu.
- Vamos ver quem chega primeiro àquela ponte?
- Vamos!, gritaram os dois, imediatamente pondo-se a correr.
Eu olhei para trás. Hernandez estava pálido como a manhã. Percebi que eu ia chorar, e comecei a correr o mais rápido que pude.
- Quem chegar por último é mulher do padre!
segunda-feira, 1 de março de 2010
Silêncio.
Nada de ar deslocado por falas,
movimento de quase não.
Abrir a boca e apenas expirar.
Um fio de linha azul dança sobre o lençol,
a respiração é a música.
O baile quieto,
o tempo de calmaria.
Nenhum som entre as curvas.
O abrir e fechar dos olhos marcando o ritmo,
o sossego ninando o corpo amansado.
A linha azul que desata seu nó.
Expirar.
Um dedo indicador corta os lábios,
ensina-os a descansar
e a adormecer entreabertos.
Nada de ar deslocado por falas,
movimento de quase não.
Abrir a boca e apenas expirar.
Um fio de linha azul dança sobre o lençol,
a respiração é a música.
O baile quieto,
o tempo de calmaria.
Nenhum som entre as curvas.
O abrir e fechar dos olhos marcando o ritmo,
o sossego ninando o corpo amansado.
A linha azul que desata seu nó.
Expirar.
Um dedo indicador corta os lábios,
ensina-os a descansar
e a adormecer entreabertos.
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