Antônio estava inquieto. Não achava de maneira alguma o que procurava. Ninguém sabia onde poderia estar. Talvez sua ex-namorada tivesse levado junto quando partira. Como ele poderia saber? Se realmente assim tivesse sido, ele nunca mais o recuperaria. Ela não atendia seus telefonemas. Disse que desapareceria da vida de Antônio. Até aquele momento a despedida não o preocupara, agora, no entanto, era diferente. Se ela o levara de fato, Antônio estaria perdido. Ele havia aceitado despedir-se dela; era a ausência da moça que ele ignorara assim, tão facilmente. Não que ele não desprendesse nenhum afeto por ela. Também não era o caso de terem brigado ou qualquer coisa do tipo. Ela era uma boa moça; era bonita, inteligente até certo ponto. O fato é que a moça o enfadava. Suas histórias o cansavam, seu sorriso lhe parecia amarelo, suas compulsões por limpeza o irritavam. Antônio sentia que a vida da namorada (agora ex-namorada) não cabia na dele. O problema era justamente esse: ela insistia em tentar colocar sua vida dentro da vida de Antônio. E ele não queria possuir a vida de ninguém, muito menos uma vida assim, tão sem-gracinha. Enfim, até então era apenas a ausência dela. Antônio não contara com esse outro sumiço. Desesperou-se. Revirou a casa inteira. Passou uma semana vasculhando. Abriu suas gavetas uma a uma, mesmo tendo medo das coisas que saem das gavetas há muito fechadas. Nada. Nadica de nada. Estava com ela, indubitavelmente. Só restava uma coisa a fazer. Sim, era uma solução drástica. Não, não era uma saída nem um pouco justa. Bem, a vida nem sempre pode ser justa. Não em momentos como esse. Antônio foi até a floricultura e escolheu as mais lindas tulipas que seu dinheiro de estagiário podia pagar. Pegou um papel. Escreveu à ex-namorada coisas bonitas que nunca diria, não para ela. Na carta, implorou, suplicou para que ela voltasse a sua vida. Antônio enviou as flores e o papel inescrupuloso. Depois ele daria um jeito nas conseqüências. O importante é que a volta da moça traria junto o que ele tanto sentira a ausência. Não deixaria nenhuma crise de consciência atrapalhar. Antônio precisava recuperar seu Surveiller et Punir autografado que herdara do tio. Afinal, Foucault era Foucault.
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